Excessões da safra: três estados devem evitar tombo maior da produção de soja

Por Redação em 07/04/2024 às 19:49:59

O receio que ganhou corpo ao longo da atual temporada agrícola acabou se confirmando: a ação do fenômeno climático El Niño penalizou a safra brasileira de soja, que será menor do que a de 2022/2023. Em sua projeção mais recente, de março, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estimou que o Brasil vai colher 146,9 milhões de toneladas da oleaginosa, um desempenho bem distante da projeção do início do plantio, em outubro, momento em que se acreditava que a produção chegaria a 162 milhões de toneladas.

A nova estimativa é quase 3 milhões de toneladas menor do que a do mês anterior e, caso o resultado se confirme, será 5% inferior à do ciclo passado, quando o país produziu 154 milhões de toneladas do grão. Pesará bastante no desempenho final a frustração da colheita em Mato Grosso. No estado que lidera a produção daquele que é o principal item de exportação do agro nacional, a produção deverá ser de 37,5 milhões de toneladas, um volume quase 18% menor do que o da safra anterior.

Algumas consultorias privadas calculam que a produção será ainda menor do que a que estima a Conab, projetando colheita de 140 milhões de toneladas. Seja qual for o volume final, é fato, primeiro, que, se o resultado é frustrante e representa uma diminuição bastante forte em relação a 2022/2023, ele é também, no histórico da cultura, a segunda maior colheita de soja que o Brasil já teve.

Também é fato que a queda, qualquer que seja o desempenho, seria ainda maior se não fosse pelo bom resultado das lavouras do Maranhão, Piauí e Rio Grande do Sul. Mesmo Tocantins e Bahia, que, com Maranhão e Piauí, formam a região conhecida como Matopiba, terão quebra de 3% a 5%.

Já o Rio Grande do Sul é um caso à parte: a colheita no estado vai crescer quase 70%, mas o número só é tão expressivo porque o Rio Grande do Sul vem de – mais – uma safra castigada por problemas climáticos. A base de comparação, portanto, era muito baixa.

A Globo Rural viajou ao Maranhão para ver de perto por que o estado ficou entre as exceções na safra de soja. Diferentemente do que ocorreu no Cerrado do Centro-Oeste, o El Niño não prejudicou tão fortemente as lavouras maranhenses, apesar de os meses de novembro e dezembro terem sido mais secos que o habitual.

"O Maranhão foi o estado do Nordeste que teve o maior volume de chuvas. A proximidade do mar, entre outros inúmeros fatores, ajuda a explicar esse quadro", afirma Willians Bini, meteorologista e diretor da área de clima da FieldPro.

O El Niño costuma causar seca prolongada no Nordeste, mas, segundo o meteorologista, as mudanças climáticas têm alterado a dinâmica de fenômenos já conhecidos. "O clima não é uma ciência exata e, por isso, temos surpresas como a deste ano", diz. Em 2023/2024, a colheita maranhense da oleaginosa deverá crescer 3,5%, estima a Conab, e passar, pela primeira vez, de 4 milhões de toneladas.

Depois de quatro horas de voo entre São Paulo e Imperatriz (MA), seis horas de carro até Balsas sob chuva ininterrupta, um pernoite, mais três horas de carro no dia seguinte, duas delas em estrada de terra, a Globo Rural chegou a São Raimundo das Mangabeiras (MA) para conhecer a Fazenda São José, a propriedade mais rentável da BrasilAgro, uma das principais empresas de negociação de terras agrícolas e produção de grãos do país.

Ela pertence à BrasilAgro desde 2017, quando a companhia comprou 10 mil hectares, de um total de 25 mil, em um acordo de R$ 100 milhões com a Usina Agro Serra. A BrasilAgro arrendou os outros 15 mil hectares por 15 anos, com possibilidade de renovação por mais 15.

A empresa mantém a parte arrendada com cana e fornece toda a produção à Agro Serra, dedicada exclusivamente ao etanol. Já a soja, e o milho no inverno, cultivados na parte própria e em 2.000 hectares da área arrendada, seguem para a esmagadora de grãos da Bunge em Uruçuí (PI) ou para o exterior, via porto de Itaqui.

O clima ajudou, é verdade, mas o bom desempenho da soja maranhense em 2023/2024 não se deve apenas a esse fator, avalia André Guillaumon, o principal executivo da BrasilAgro. No período de cinco anos, a companhia investiu R$ 180 milhões para melhorar os processos e o manejo os 10 mil hectares que pertencem a ela. "Tivemos que plantar alguns talhões da fazenda nesta safra, mas a produtividade média deve repetir o desempenho do ciclo passado, com cerca de 60 sacas por hectares", afirma.

O eixo principal da propriedade, localizada entre São Raimundo das Mangabeiras e Fortaleza dos Nogueiras (MA), tem 32 quilômetros, o que exige um deslocamento adicional de uma hora entre a sede da fazenda e a lavoura propriamente dita. A fazenda está em uma região mais alta, propícia para as chamadas chuvas orográficas, que têm relação com o relevo do local, explica o meteorologista Willians Bini.

Essas chuvas ocorrem quando uma massa de ar é "bloqueada" por uma área de altitude elevada (montanhas, por exemplo), tendo que se elevar para atravessá-la. Nesse movimento ascendente, a umidade satura ao redor e provoca a precipitação.

Comprada por R$ 100milhões, a propriedade foi avaliada pela Delloitte em R$ 475 milhões. "A área é uma mesa, uniforme e sem parte ruim para o cultivo", diz Gustavo Javier Lopez, diretor financeiro da companhia. Segundo ele, o retorno sobre investimento na fazenda acompanha outras áreas maduras, que é de 5% a 8% para as terras próprias e 20% nas arrendadas.

Outras propriedades da região têm menos tecnologia (e recursos), mas também tiveram um clima menos ruim que o Centro-Oeste. "Quem plantou mais tarde se deu melhor. Mas as chuvas também não chegaram em igual volume em todo o estado nos meses seguintes", afirma o presidente da Associação de Produtores de Soja e Milho do Estado (Aprosoja-MA), José Carlos Oliveira de Paula.

Segundo Oliveira de Paula, as lavouras do Estado e de seus vizinhos ficaram irregulares, com algumas repetindo o desempenho da São José e outras bem ruins. "Além do clima, claro, o manejo faz diferença. O pacote de insumos tem que ser adequado, as sementes e o maquinário também", resumiu. Na fazenda do dirigente, em Tasso Fragoso, sul do Estado, seus 1.000 hectares de soja sofreram com o tempo seco. A produção, admite ele, deve diminuir.

Fonte: Globo Rural

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