Impactados por perdas causadas pela seca em safras consecutivas e uma enchente sem precedentes em 2024, produtores rurais gaúchos articularam com o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) a apresentação de um projeto de lei para criar um programa de securitização para as dívidas da agropecuária gaúcha de até R$ 60 bilhões.
O Estado enfrenta nova estiagem e altas temperaturas neste início de ano que já impactam no resultados de algumas lavouras, como mostrou a Globo Rural. A proposta será protocolada nesta quinta-feira (6/2) no Senado Federal e apresentada em evento da Associação dos Produtores de Soja do Rio Grande do Sul (Aprosoja-RS) em Porto Alegre nesta tarde.
O projeto prevê prazo de 20 anos para o pagamento das dívidas, bonificação de até 30% para credores adimplentes e taxa de juros que varia de 1% a 3% ao ano. O texto ainda cria um fundo garantidor para as operações e uma nova linha de crédito específica para o público atendido.
A proposta permite que as dívidas sejam convertidas em títulos lastreados pelo Tesouro Nacional até o limite de R$ 60 bilhões, para garantir as operações de alongamento dos saldos, com condições especiais de pagamento e comercialização no mercado financeiro. Os papéis públicos poderão ser emitidos para garantir o valor total das operações ou o valor da equalização decorrente da mudança de vencimento do passivo.
Serão contempladas operações de custeio, investimento e comercialização contratadas até 30 de junho de 2025. Dívidas de Cédulas de Produto Rural (CPRs) bancárias e outros títulos também poderão ser incluídas, além de contratos já judicializados. O teto de renegociação proposto é de R$ 5 milhões e inclui dois anos de carência.
O projeto contempla produtores rurais, cooperativas agropecuárias e agroindústrias que tiveram perdas desde 2021, desde que estejam em municípios que decretaram situação de emergência ou calamidade pública ou que os prejuízos sejam comprovados por laudo técnico.
O Fundo Garantidor para a Securitização das Dívidas Rurais (FGSDR), previsto no projeto, será mantido por meio de recursos provenientes dos próprios produtores rurais, que deverão destinar 0,2% do valor da produção para o fundo. O mecanismo pode contar ainda com a participação de recursos dos fundos constitucionais de financiamento do Nordeste (FNE) e do Centro-Oeste (FCO) e do Fundo de Defesa da Economia Cafeeira (Funcafé). Não há previsão de quanto o fundo poderia arrecadar.
O projeto de lei também prevê a criação de uma linha de crédito especial, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para a recuperação de solo e para investimentos em irrigação. A sugestão é que linha ofereça juros de até 5% ao ano.
Para Heinze, a proposta oferece condições de recuperação para esses produtores afetados pelo clima de forma recorrente. A aprovação e implementação de um programa como esse, no entanto, dependerão de intensa articulação com o governo federal.
"Este é um texto inicial que atende às necessidades dos produtores e preserva a produção de alimentos. O próximo passo é articular sua aprovação e realizar um trabalho de sensibilização junto ao governo federal. Os produtores gaúchos necessitam desse tempo para recuperar as perdas causadas pelas chuvas e secas que devastaram as condições de trabalho no Rio Grande do Sul", afirmou o senador.
A proposta inclui também mecanismos que asseguram a manutenção do acesso ao crédito aos produtores gaúchos, sem penalidades bancárias, prorrogação automática de 12 meses em caso de novo evento climático e exclusão das parcelas cobertas pelo Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro). O saldo devedor será apurado segundo as normas fixadas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Segundo o texto, serão contempladas no processo de securitização as dívidas com bancos públicos, privados, cooperativas financeiras e agentes financeiros autorizados.
"A medida se fundamenta em experiência bem-sucedida da securitização anterior - leis nº 9.138/1995 e 10.437/2002 -, que estabeleceram modelos de renegociação com prazos diferenciados, juros subsidiados e mecanismos de incentivo à adimplência", diz a justificativa do projeto. "O modelo ora proposto avança ao incorporar novas salvaguardas, oferecendo uma solução mais moderna e ajustada à realidade atual do setor agropecuário", completa.
As regras gerais preveem até 20 anos para pagamento da dívida, com dois anos de carência. As taxas de juros propostas são de 1% ao ano para beneficiários do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), 2% para o Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp) e 3% para os demais produtores.
O limite de renegociação será de R$ 5 milhões por produtor. A proposta prevê bonificações para credores adimplentes, como desconto de 30% sobre cada parcela paga dentro do vencimento, limitado a R$ 100 mil, e 15% sobre o valor que exceder esse limite.
A proposta ainda indica acesso prioritário a linhas de crédito especiais para investimento e custeio rural aos produtores securitizados. Os detalhes deverão ser definidos pelo CMN.
O projeto diz ainda que as garantias exigidas para a renegociação das dívidas serão as usuais do crédito rural, com aproveitamento das garantias já ofertadas às instituições financeiras nos contratos originais. O texto também veda a exigência, pelo agente financeiro, de apresentação de garantias adicionais ou superiores a 1,3 vezes o valor da dívida.
O texto prevê fiscalização rigorosa da execução do programa pelo Banco Central e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Fonte: GR